terça-feira, 1 de março de 2016

Eu, gorda

Então eu voltei à faculdade este ano. Eventualmente escreverei sobre isso também. Mas aqui eu mando um abraço ao perfeccionismo e resolvo não ligar para a ordem dos fatores e simplesmente compartilho algo que há pelo menos 25 anos define a minha vida: meu peso.

O importante é parecer feliz nas fotos
Na verdade não meu peso exatamente, pois eu nem sei quanto estou pesando. Mas como a minha relação com a comida sempre esteve longe de ser harmoniosa.

O que a faculdade tem a ver com isso? Temos uma disciplina chamada "Autoconhecimento e Desenvolvimento Interpessoal" e, em determinada aula, o Professor pediu que escrevêssemos sobre nós ou sobre autoconhecimento, porém em versos. Eu não costumo escrever em versos, acredito que essa tenha sido minha primeira vez.

E o que saiu, foi isto:

Toma esse veneno,
Disse sua mãe enquanto lhe dava brigadeiro.
Nossa, que linda!
Não engordou depois de todos esses dias!

Todo dia um controle externo
Sobre o seu corpo era feito.
Não é bonito para uma moça comer mais que um rapaz.
Tem que ser pequena, delicada.

“Ela é grossa, é emburrada!”.
Sempre as melhores qualidades ressaltadas.
Não tinha sossego nas férias nem nas festinhas.
“Soube que você caiu de boca na comida”

Aos 11 anos sua primeira dieta.
Aos 13 anos começou academia.
“Vamos ver se dessa vez dá certo.”
Nunca dava.

Quando ficou doente e ficou internada
“Ao menos se eu fosse magra...” é o que pensava.

Temiam que ela fosse piada entre os outros.
Mas ela já o era dentro de casa.
O assunto da família, todos os dias do ano.
Seu peso viajava o Brasil.
Anunciavam que havia emagrecido
“Tá tão linda...”

Mas diziam que era com sua saúde que se preocupavam.
Que saúde é essa que quando está magra é bonita e não saudável?
Vai entender... ela nunca entendeu, apenas sofreu.
Hoje pedem desculpas, hoje admitem “não deu certo”.
Agora cabe a ela, mais uma vez sozinha, se encontrar.
Encontrar o amor próprio que nunca foi encorajado
No seio de sua família.

“Mas você é tão linda!”
Pode até ser verdade e ela pode até saber. Mas não é como se sente.
Todo dia a mesma luta, a mesma dúvida:
Será que um dia vai gostar de si como é?

Mas não foi por mal, vão dizer.
Nunca é.
E também não é por mal que hoje tudo isso pode ser expresso
Por meio deste verso.

2 comentários:

Rafael Tiago S. B. do Couto disse...

De alguma forma me identifiquei. Obrigado pelo texto!

Pedro Ribeiro Ferije disse...

Rs.
Achei seu blog por acaso,mas não aquele acaso a que Lia Luft se refere no seu livro O lado fatal."somos reféns dos acasos que nos roubam amores e paixões"...aliás,este livro é fantástico,um relato difícil e inatingível,Recomendo.
Meu acaso é bem menos envolvente,além de tangível.
O meu acaso é o do ócio,o da curiosidade,o da certeza q de tanto procurar agulha num palheiro eu acharia.Aqui estou,duas da madrugada comentando o quarto texto do seu blog e pensando que enquanto você reclama,neste relato,sobre o exagero da alimentação.Eu,paradoxalmente e neologicamente,"ranzinzeio" a falta de alimentação do seu blog.ESCREVA MAIS.
:)